sábado, julho 14, 2007

Chapter I - London, London...


























Troquei Curitiba, onde morava na época, por Londres em junho de 1999!!!

Passei meu aniversário (que é no dia 16/06, para aqueles que ainda não sabem ou não se lembram!) com minha família. Na época eles moravam em Jundiaí (que eu carinhosamente chamava de JUNDIUÓ, por detestar morar lá...). Eu morava em Curitiba por causa da faculdade, a UFPR que quase me deixou doido...

Não consegui embarcar em Sampa. Vôos lotados. Verão europeu. Meu vôo saiu do Galeão, no Rio, no dia 17/06.

É claro que nem consegui dormir à noite, durante o vôo. Só uns cochilos! Um turbilhão de pensamentos invadia todo o meu ser... Europa pela primeira vez! Morar em Londres, sonho antigo se concretizando...

Acordei de manhã no exato momento em que o avião saía de cima do Oceano Atlântico e começava o continente europeu. Conseguia visualizar o solo (talvez Portugal, tal vez España, who knows?), pouquíssima vegetação, raríssimos vilarejos, nada que lembrasse um mundo civilizado! Essa foi minha primeira visão (e impressão visual) da Europa.

Voei com a Iberia, que sempre, até hoje, oferece boas tarifas para toda a Europa. Fica aí a dica para os que pretendem conhecer o "Velho Continente". O vôo fez escala no aeroporto Barajas(de Madrid), onde esperei a conexão por algumas horas. Calor extremo em Madrid, + de 40 graus C...

O vôo Madrid/London chegou em Heathrow no meio da tarde (do dia 18/06). Fazia muito calor (mais de 30 graus C) e eu suando dentro do meu terninho...

Durante o procedimento de aterrisagem, quando ví pela janela os carros trafegando na mão esquerda, as casas de tijolos expostos, tudo muito típico, me deu um misto de alegria e pavor. Mas aí já estava lá, precisava viver essa experiência...

Já na imigração, o choque: "the British accent"!!! Eu, antes de ir, já dava aulas de inglês no Brasil. Mas estudei e ensinava inglês americano (que, preciso confessar, hoje em dia me soa tão vulgar!!!).

Passei sem dramas. Mas quem viaja sem passaporte europeu geralmente sofre para entrar e as historias de problemas e deportacoes sao muitas. Portanto atencao e organizacao para nao terminar a viagem ja mesmo no aeroporto.

Ainda em Heathrow, trocar dólares por pounds, ligar pra casa e avisar que chegara, pegar metrô e ir para meu futuro endereço residencial. Tudo novo, tudo diferente, tudo encantador...

Fui morar em Weston Street (SE 1), pertinho da London Bridge Station.Excelente lugar, ótimo apartamento, que eu dividia com uma escocesa chamada Sue. Da janela da cozinha se avistava, lá longe, o Big Ben. Do outro lado, bem pertinho do flat, repousava a linda Tower Bridge, esplendidamente iluminada à noite!

Às 9 da noite ainda tinha um pouco de iluminação solar... achava estranho e curioso o sol se pôr tão tarde.Era verão, e o verão na Inglaterra é esperado com muita alegria pela maioria dos habitantes. As pessoas vão aos parques, fazem caminhadas e atividades ao ar livre, há shows por todos os lados, a cidade se enche de cores, as flores ficam lindas, as ruas se enchem de turistas do mundo todo, todos aproveitam ao máximo mesmo.Dizem que Londres têm somente 60 dias ensolarados por ano. Mais tarde, quando já com a chegada do outono, fui perceber a razão de tanta celebração durante o verão...

A Sue era simpática (ou pelo menos tentava!). Ela era enfermeira, passava o dia inteiro fora, e eu ficava sozinho no flat. De início percebi que a Sue não era das mais higiênicas (pela desordem da cozinha e pela sujeira da banheira). Como no começo, ainda jobless, eu ficava à toa em casa, fazia faxinas homéricas no flat inteiro (menos no quarto da Sue, trancado à sete chaves sempre). Medo de ser roubada? Preconceito? Whatever! De qualquer maneira a limpeza do flat me serviu como experiência para os futuros trabalhos que conseguiria como cleaner...

A Sue era gorda e comia muito. Nunca me convidava com nada (depois percebi que os britânicos, em geral, são assim mesmo!). Ela comia tons of food sempre trancada dentro do quarto dela e depois saia, saciada, para conversar comigo. Eu só ficava imaginando a sujeira que deveria ser dentro daquele quarto que nunca cheguei a ver...

Nossa comunicação no começo era péssima.Ela tinha um sotaque escocês carregadíssimo. E muitas vezes eu nem sequer entendia o que ela falava.Era só o começo da percepção que desenvolveria dos mais variados accents que existem naquela louca metrópole!

Sem temores e com muita curiosidade, começei a explorar os arredores. E com a ajuda de um guia de bolso que a Sue me deu, arriscava caminhadas cada vez mais longas...

Percebi que andar de metrô em Londres é quase uma heresia, um pecado sem perdão!Usei o "tube" poucas vezes, somente quando tinha pressa de chegar mesmo.Caminhava muito!!! Ou senão aproveitava a vista nos "double decker buses" que cortam toda a cidade...

Consegui meu primeiro emprego por acaso! O dono do flat, Jeff (uma bicha esquisitona nascida em Cingapura), me visitou para saber minhas impressôes e como andava minha adaptação. Conversa vai, conversa vem, ele comentou que precisava de alguém para pintar as paredes e chão do flat. Eu me ofereci e ele me propôs que, enquanto estivesse pintando, ele não me cobraria o aluguel (semanal) e ainda me pagaria 50 libras. Aceitei no ato e começei no dia seguinte. O serviço durou 2 semanas. Hard job! Nunca tinha feito nada semelhante no Brasil...

O que mais me impressionou em Londres foram as pessoas!!! Observava ao meu redor, por onde quer que fosse, aos detalhes que via em cada um. Por se tratar de uma sociedade multicultural, multiracial e totalmente cosmopolita, a diversidade de tipos humanos é vastíssima...

TODOS TEM ESTILO!!! Cada pessoa tem algum detalhe único que o diferencia da grande massa. Alguns apresentam um visual tão andrógino que me faziam pensar até onde vão as diferenças de gênero. Outros se vestem para chocar. Outros são bizarros mesmo.E há as infinitas tribos urbanas: punks, góticos, clubbers e ravers, new romantics, skinheads, mods, rockabillies, skaters, and so on...

Mas uma coisa é certa: EM LONDRES TODAS AS PESSOAS TEM ESTILO!!! O curioso é que essa "atitude ao vestir-se" acontece naturlmente, de forma despretenciosa. Não é algo forçado, do tipo "hoje vou pôr uma melancia no pescoço porque quero apareçer". Não é um "fake", como Hollywood!

VANGUARDA TOTAL!!! Londres é, historicamente, um celeiro de novas idéias e modismos. T-U-D-O surge primeiramente lá!!!

Eu tinha alguns "British pen pals" espalhados pelo UK antes de ir. Lá chegando, tratei de avisar que estava em London, enviei-lhes meu endereço e telefone e ansiei por um possível encontro real. Curiosamente, aconteceu o inverso do que imaginei: todos trataram de dar desculpas esfarrapadas e aos poucos foram "perdendo" contato. Aqueles anos de trocas de correspondências e confissões à distância se dissolveram no ar. Nesse momento percebi que o melhor no Reino Unido são os estrangeiros que por lá habitam!!!

Yes, babies! Os britânicos em geral são frios, distantes e superficiais. Só que eles te desprezam com elegância e requinte, como nenhum outro povo na Terra é capaz de agir! Que povo admirável!!!

Sozinho no flat, assistia muita BBC (principalmente para me habituar ao sotaque britânico) e ouvia muita rádio também. Minha favorita? XFM London!!!
Dois amigos meus já estavam em Londres há algum tempo quando fui: o Fábio Assoon (de Santos) e o Marc Hickpollen (de Sampa). Nos conhecemos na cena gótica paulistana, no antigo Retrô. E desde então a amizade "da noite" se solidificou e nos tornamos "close friends". Eles estavam morando em Camberwell e fui ao encontro deles. Os piás moravam num casarão vitoriano numa ruazinha sem saída linda! O "landlord" alugava quartos somente para gays, e o ambiente era totalmente liberal com relação à tudo (EU DISSE T-U-D-O!!!), embora os "veneninhos" entre a bicharada reinasse...Mais tarde também viria a morar aí, em Vicarage Grove, Camberwell, SE 5.

Fui com os guris (Fábio, Marc e o Paulo - uma "paneleira" portuguesa divertidíssima, que mais tarde se tornaria meu amigão) ao Father´s Red Cap, um gay pub bagaceirão aí pertinho da casa deles, em Camberwell Green, uma pracinha sem graça que servia de ponto de referência para se chegar à Vicarage Grove.

O Father´s Red Cap era um ambiente escuro, frequentado por uma bicharada decadente e de idade avançada. Era divertidíssimo, um lugar onde ríamos muito e saíamos com a auto-estima lá nas nuvens, devido aos olhares e cantadas mil que recebíamos (todos nós!)! O poppers rolava solto (aliás, em Londres poppers é como água, TODO MUNDO usa!!!). E os "pints of Guiness" também... Adoooro!!!

A vida noturna em Londres é vibrante sempre. Têm opções para todos os gostos, estilos e bolsos. A cena gay é riquíssima e diversificada, e uma das boas maneiras de saber "what´s going on around town" é pegar um exemplar da QX, uma publicação distribuida gratuitamente na maioria dos gay venues. Guia completo!

O Marc me passou o nome e telefone de uma agência e fui atrás de emprego, lá longe, em Acton Town. Passei na entrevista e comecei a trabalhar como "waiter", na Cover Staff Catering.

Eu era solicitado para trabalhar em restaurantes, eventos, festas ou em "social clubs". Eles me ligavam diariamente e me passavam o endereço e o horário onde trabalharia, e lá ia eu. Ganhava por hora, mas o preço variava de lugar para lugar (5 to 15 pounds per hour). às sextas-feiras eu passava na Cover Staff para pegar o cheque do HSBC, e trocava lá em Acton mesmo. Em alguns lugares era legal trabalhar, em outros era um saco! Passei apuros porque jamais trabalhei como garçom no Brasil.

O legal desse serviço era poder comer bem no fim do "expediente". For free! Quase não gastava com comida por fora. Além disso sempre rolava uma gorjeta amiga que fazia a diferença no fim de semana...

As cozinhas em Londres são dominadas por estrangeiros. Os chefs geralmente são espanhóis, portugueses, franceses ou italianos. Já os garçons... mmm... de todas as nacionalidades que se possa imaginar: brasileiros, mexicanos, poloneses, romenos, moldavos, sul-africanos, cipriotas, indianos, armênios, filipinos, caribenhos (de todas as ilhas)...

Durante o verão, no meu tempo livre, adorava sentar nos parques (principalmente no Hyde Park e em Kensington Gardens) e observar as pessoas.Londres têm muitas áreas verdes, em todas as direções. No verão todos os espaços verdes se enchem de cores, flores, gente, barulhos, apresentações, discursos públicos. É muito bom!

Quando estive pela primeira vez diante do Serpentine, no Hyde Park, fiquei imaginando que fora alí que Madame Blavatsky conhecera Morya, seu guru indiano. Pode-se dizer que naquele momento, por volta de 1850, foi plantada a semente para a criação da Teosofia (sistema filosófico, místico e ocultista).

Não posso deixar de mencionar que em Londres me aproximei mais do movimento Hare Krishna, começei a estudá-lo, frequentar as aulas e fazer as deliciosas refeições vegetarianas, prasada. O templo Hare Krishna que frequentei era o da Soho Street, perto da Soho Square. Bem central e com os devotos mais amáveis que já conheci até hoje...

Uma tarde estava caminhando na New Kent Road, perto da Elephant and Castle Station, quando um quadro de avisos na vitrine de uma loja me chamou a atenção. Anotei alguns telefones de empregos e fui pra casa telefonar.


Começei a trabalhar como "cleaner" já no outro dia!Os donos da empresa eram irlandeses, Mary and Malcolm, um casal muito simpático.Saía de casa às 4 da manhã para limpar um andar inteiro de uma faculdade localizada em Old Gloucester St. (WC1), quase em frente a Queen Square, uma pequena e charmosa pracinha, onde eu ficava sentado esperando o casal chegar e abrir a faculdade.A estação de metrô mais próxima era Holborn, mas eu só usava o metrô quando estava apressado mesmo. Quase sempre ia de ônibus até Holborn station e caminhava até a faculdade.Era curioso observar as garrafas de leite e os jornais nas portas das casas... algo quase surreal para nós, não?


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